Transcrição do episódio "184 – Machado de Assis e a Reclamação"
Olá, pessoal! Meu nome é Fabiano Goldacker. Sou Coach Executivo da Ponte ao Futuro.
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Vamos falar de:
RECLAMAÇÃO
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Lágrimas não são argumentos.
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Todos nós já fomos crianças um dia e talvez, em nossas distantes memórias, a gente se lembre de algum episódio no qual a gente chorou e esperneou porque queríamos muito alguma coisa ou queríamos muito que algo fosse feito do nosso jeito. E já que choro de criança é uma das coisas mais angustiantes que existe, invariavelmente nossos pais ou os adultos envolvidos na história acabam fazendo aquilo que queríamos, só para nos satisfazer, para que parássemos de chorar e, principalmente, para que eles tivessem um pouco de paz. Quem tem filhos sabe muito bem do que estou falando, pois aí nos colocamos no lugar do adulto que vê a criança chorando e naquele momento de stress acaba cedendo aquela pequena demonstração de tristeza e, por que não dizer, de chantagem emocional.
Nesse momento talvez haja aquela pessoa que, ao ouvir essas palavras, pense que esse podcaster que vos fala é uma pessoa insensível, sem coração, que considera o choro infantil algo que as crianças usam para nos manipular. Mas não é bem assim. Só que eu já fui criança, tenho duas filhas maravilhosas e é justamente por isso que sei que às vezes a criança utiliza suas lágrimas para nos convencer de algo. De forma inconsciente, os pequenos e as pequenas sabem que lágrimas podem ser usadas como argumentos porque também sabem que os adultos têm empatia ou simplesmente não suportam o choro infantil. É uma afirmação um tanto dura, mas é assim que as coisas são.
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Lágrimas não são argumentos. É esse o título do episódio de hoje. Essa frase foi proferida por Machado de Assis, que é considerado o maior escritor brasileiro de todos os tempos. Ele produziu obras em praticamente todos os gêneros literários. Foi poeta, romancista, cronista, dramaturgo, contista, jornalista e crítico literário. O mais interessante é que Machado de Assis nasceu em uma família pobre. Estudou muito pouco e nunca foi à universidade. Isso não o impediu de lançar várias obras-primas, como Dom Casmurro e Memórias Póstumas de Brás Cubas. Algumas de suas obras foram, inclusive, adaptadas para a TV e o cinema. Machado de Assis foi considerado muito inovador para a sua época.
Sua produção era de vanguarda e isso faz com que sua obra literária seja estudada até hoje e também faz com que ele seja considerado, por muitos, um dos grandes gênios da história da literatura, ao lado de nomes com William Shakespeare e Luis de Camões. Já falamos de Machado de Assis aqui no Coachitório Online, há bastante tempo atrás, lá no episódio #19 da primeira temporada, na qual falamos das lições de Machado de Assis sobre legado. E um dos pontos que mais me aproxima do grande escritor é que Machado de Assis é o nome da escola pública de Blumenau em que eu estudei por todo o meu 1º Grau e onde eu fiz amizades que perduram até hoje e onde eu posso dizer que eu fui verdadeiramente educado.
A frase de Machado de Assis que dá título a este episódio tem um significado muito simples, porém muito profundo. Não adianta chorar e espernear. É preciso bem mais do que choramingar se quisermos argumentar com alguém ou influenciar os comportamentos e atitudes de outra pessoa. Digo isso porque é comum nós acharmos ou até tratarmos as crianças como mini-adultos. Essa ideia é falsa, mas o contrário é verdadeiro, ou seja, embora as crianças não sejam mini-adultos, os adultos são eternas crianças e não só no sentido nostálgico e romântico da expressão, mas também no que diz respeito a usar um pouco de chantagem emocional para conseguir o que desejam.
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Usar a chantagem emocional para conseguir o que deseja não é uma boa ideia. Mas é uma estratégia eficaz, pois muitas vezes as nossas lágrimas de crocodilo encontram alguém que se sensibiliza e que mostra um alto grau de empatia pela emoção que demonstramos. E aí acabamos conquistando aquilo que desejamos porque, do outro lado, há alguém que “comprou” as lágrimas que usamos na nossa argumentação. Pode até ser que nosso pedido seja legítimo e o que desejamos seja importante, mas eu questiono a forma, ou melhor, as armas que utilizamos para argumentar a favor do que desejamos.
Bom, já deu para notar que eu sou bastante crítico deste tipo de comportamento. Não só do chororô, mas também do oposto, ou seja, da agressividade na argumentação. Falamos sobre isso lá no episódio #139 da 5ª. Temporada do Coachitório Online. Naquele episódio, eu falei sobre uma frase do bispo sul-africano Desmond Tutu, ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 1984. Ele disse que seu pai havia lhe ensinado a seguinte lição: “- Não levante a voz! Ao invés disso, melhore os seus argumentos!” Perceba que tanto o lado mais agressivo da comunicação, que é quando levantamos a voz, bem como o lado passivo da comunicação, quando usamos da lágrima ou da chantagem emocional para reforçarmos nosso argumento, são estratégias desgastantes e infundadas. São estratégias de quem não tem estratégia, argumentos de quem não tem argumento. Mas são estratégias que funcionam porque as pessoas que estão do outro lado cedem porque não querem mais serem submetidas à coerção ou à enchição de saco daquele que só tem gritaria ou lágrimas para argumentar.
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Mas por que tanta gente apela para o lado emocional para apresentar e convencer com seus argumentos? Lembro de uma frase de Napoleon Hill, o escritor americano que ficou mundialmente famoso por sua obra voltada à importância do pensamento positivo para o enriquecimento pessoal. Certa vez ele disse: “- Quem ganha na tribuna não é o advogado que conhece melhor a lei, mas sim o que prepara melhor sua argumentação.” E eu adoro ver aqueles filmes ou séries americanos que mostram o embate jurídico entre advogados e promotores diante de um tribunal cheio e de um comitê de jurados que tem como missão condenar ou absolver aquele que está sendo acusado. De um lado, a acusação usando os argumentos lógicos e racionais para mostrar a culpa do acusado. Do outro lado, a defesa utilizando argumentos que apelam mais para a sensibilização e empatia dos jurados para mostra que o acusado não fez o que alegam que ele tenha feito. Às vezes dá certo, às vezes não. Mas no tribunal da vida, nem sempre é o conhecimento que convence. Acaba convencendo aquele que usar os melhores argumentos para convencer o outro.
Isso está totalmente ligado ao perfil comportamental das pessoas. É um dos temas que eu mais gosto de estudar na área de comportamento humano organizacional e é uma das abordagens que eu mais utilizo nos treinamentos e consultorias que realizo pela Ponte ao Futuro. Falamos bastante sobre perfil comportamental aqui no Coachitório Online, mais especialmente no episódio #52 da 3ª. Temporada, no qual comentamos sobre o que o perfil comportamental tem a nos ensinar. Quem conhece o perfil comportamental das pessoas consegue fazer com que a sua comunicação seja adequada ao perfil do outro e, assim, consegue se fazer entender melhor e consegue entender melhor as outras pessoas.
Além disso, quem conhece bem o perfil comportamental conhece também a melhor forma de argumentar com o outro. Sabe, inclusive, que há pessoas para as quais as lágrimas são os melhores argumentos, assim como há pessoas para as quais é necessário levantar a voz para argumentar melhor. Veja que o perfil comportamental explica porque somos suscetíveis a um ou outro tipo de argumentação e explica também porque tanta gente tenta nos convencer por meio das suas lágrimas. O contato com o outro – principalmente em reuniões, quando argumentos são apresentados e interesses são defendidos explicitamente, com muito mais do que palavras – permite que nos coloquemos em seu lugar.
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Mas eu prefiro pensar que há formas melhores de fazer isso. Podemos (ou devemos) ser mais assertivos em nossa comunicação. Devemos ser mais claros nas nossas intenções, assim como as pessoas com quem argumentamos também devem aprender mais a dizer não. Não devemos precisar de lágrimas para argumentar a favor de algo que consideramos importante. Penso que isso não é justo para com aquele com quem argumentamos. E, em uma opinião bem particular, penso que esse tipo de argumentação provoca somente o afastamento do chorão do convívio das pessoas, pois há aqueles que não suportam o comportamento vitimista daquele que sempre se coloca em condição de inferioridade ou lamentação para conseguir o que deseja.
Como eu disse, essa é uma opinião bem particular, é o efeito que esse tipo de comportamento exerce em mim. Não quero, com isso, dizer que é a forma certa de reagir perante a essa situação, até porque eu acredito que é algo que eu preciso trabalhar em mim também. No entanto, tenho certeza de que isso que eu falei faz sentido para muita gente, pois há muitos que pensam da mesma forma. Quer dizer que, para os chorões de plantão, nem sempre lágrimas serão argumentos.
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Fala, galera do Coachitório Online.
Escrevo esse episódio no dia 7 de abril de 2023. É sexta-feira Santa, feriado. Mais do que um feriado, é um dia de penitência, de reclusão, de não trabalhar. Dia em que muitos católicos do mundo inteiro derramam lágrimas em honra aquele que derramou seu sangue para nos salvar na cruz. Mas eu precisei escrever esse episódio no dia de hoje porque dois dias atrás, em 5 de abril, uma terrível tragédia se abateu sobre Blumenau, a cidade onde nasci e onde eu moro. Um atentado inexplicável a uma creche tirou a vida de quatro pequenas crianças, deixou outras feridas e arrancou um pedaço da vida das famílias destes anjinhos. Muitas lágrimas foram e estão sendo derramadas por conta do que aconteceu.
Lágrimas não são argumentos. Mas são uma forma de mostrar amor e alegria, como também são uma forma de mostrar dor e saudade. De uma forma muito singela, o Coachitório Online dedica esse episódio às crianças que se tornaram anjos de Deus. Que as lágrimas que derramamos sirvam para abrandar o sofrimento e trazer paz para as famílias. O episódio de hoje termina aqui, com um momento de silêncio.
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Encontro você no próximo episódio! Um abraço!